quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Relatório de visita à Escola Cantalice Magalhães

Formação continuada de professores de Educação Física – PMJP
16 de junho de 2008

A escola está situada no Bairro das Indústrias em área de periferia da cidade, com difícil acesso. Funciona com 13 salas de aula, do 1º ao 9º ano, com turmas de EJA, Acelera e Se liga (projetos da ONG Airton Senna).
Deparamos-nos com os alunos no horário do lanche, refeição minguada composta por seis biscoitos com um copo de iogurte de morango.
Conversamos incialmente com a Diretora da escola que reclama da obra prometida para recuperação e cobertura da quadra, que segundo ela “botaram para a Anayde Beiriz (escola)”, “a gente quer acabamento, conclusão de nossa quadra, faz oito anos que a gente nesse vai-vai, acho que deveria ser assim: primeiro a nossa, pra depois a de lá que é uma escola nova, ta começando agora, conversei até com Ariane (Secretária de Educação) dizendo que eu não entendi o porquê de começar por lá primeiro”.
Fala das condições precárias para as aulas de educação física e relata que utilizou dinheiro do FNDE para dar conta daquele velho problema do vizinho que nunca devolve as bolas que caem em sua casa:
“Peguei o dinheiro do PPDE e botei aquele alambrado, porque é um problema com o vizinho que é brabo e toda a bola que cai do lado de lá ele rasga ou não devolve, mas é caríssimo esse negócio, além do lado de que cá das salas (sic), o professor ta dando aula e de repente uma bolada”, mostrando que a curta distância entre a quadra e a sala de aula.
A diretora aproveita e mostra o vestiário da quadra que terminou virando depósito do material de educação física, e afirma que ainda não chegou material de educação física este ano.
A professora de Educação Física é prestadora de serviço há quatro anos. Leciona em 6 turmas do 1º ao 3º ano (tem uma turma do Se liga). Diz que trabalhava à noite, mas afirma que houve uma reformulação e o “Prefeito” tirou a possibilidade dos professores trabalharem 60 horas e que agora a carga horária máxima é de 40 horas semanais. Por isso acha que a escola está sem professor de educação física a noite.
A professora ministra aula de Dança Circular, Alongamento e Yoga e também trabalha em outra escola Municipal (João Medeiros, no Bairro dos Novaes).
A mesma reclama da falta de bolas e diz que tem que trazer de casa (o outro professor trabalha com voleibol e possui uma única bola), diz que perderam a chave do depósito da sala improvisada de educação física, que na verdade é um banheiro e, por isso, não tivemos acesso. Reclama das condições do trabalho quando fala da precariedade de recursos materiais e das instalações físicas:
“Tenho que trazer o som de casa para poder dar aula de dança e ensaiar para o São João, hoje não trouxe o som, estamos sem ensaiar... o som daqui ta empipinado, é complicado aqui, viu.”
“Tem um colchão grande rasgado que dá para fazer aula de ginástica de solo, precariamente, mas dá, mas só até às 9h, porque não tem quem agüente o sol, depois das 9h, o sol torrante”
Com relação aos alunos afirma:
“Os alunos do Acelera e Se Liga são alunos que a gente chama de danado, rebelde, que não gosta de estudar.”
Continua relatando as condições de trabalho:
“As dificuldades são tantas, você já está vendo a quadra, o aluno caiu tem que estar com PVPI direto, minha bolsa é cheia de remedinho aqui, PVPI, gaze, enfim. Olha, o muro ta caindo, a gente já falou com a secretaria, então assim, o recreio daqui foi excluído, porque foi um medo muito grande os meninos tavam vindo pra cá (para o muro), era melhor tirar (o recreio) do que terminar um morrendo. Era muita violência no recreio.”
Faz um apanhado geral das dificuldades do trabalho com a educação física:
“As dificuldades aqui: a quadra não é coberta, o piso é grosso, caiu se arrebentou, não dá pra fazer, por exemplo, uma aula de capoeira, não dá pra fazer uma aula perfeita de ginástica de solo, porque os meninos não suportam sol – tia ta queimando as minhas costas. Entrou na quadra eles não podem mais sair para tomar água, pois não tem bebedor na quadra, só quando termina a educação física.”
“Os alunos são muito indisciplinados, muita briga com canivete, mas graças a deus melhorou muito, alunos de 1º ano com canivete, por isso que foi tirado o recreio desde o ano passado.”
Comenta sobre um dos alunos que passou e falou conosco:
“Esse menino que passou e que tava descalço, nós tivemos muitos problemas com esse menino, esse menino vinha para escola de manhã e de tarde ia roubar, mas graça a deus nós conversamos com a família, a família dele é muito carente, vende garrafas plásticas e foi uma luta com esse menino durante dois anos.”
Como trabalha com dança, diz ter dificuldades em trabalhar com tal conteúdo:
“A aula de educação física não avança por causa dessa quadra, porque aí nós poderíamos fazer aula de dança e yoga e o que eles precisam mais aqui é aula de alongamento e de yoga... e capoeira. Então a gente faz assim, o básico do básico.”
“A aula de dança acontece o seguinte, eu tenho que trazer o som de casa, eu sei que o projeto é a parte, mas assim comentando, então se eu quiser dança na aula de educação física, que eles adoram, amam de paixão, eu tenho que trazer som de casa e extensão, e aí ou eu uso aquele espaço (pátio) ou eu uso a sala de aula.”
Mostra uma sala de aula com alunos do 1º ano e tece a crítica, apontando para uma sala pequena e inadequada, aparentemente improvisada:
“Aqui é como se fosse depósito dentro da sala de aula”.
Diz que por vezes atuou como agente de limpeza de certas áreas da escola:
“Aqui eu dava aula de educação física, mas estou sem tempo de limpar (mostra área da escola com mato), eu literalmente limpei, fiz uma campanha com os meninos para limpar lá do outro lado, mas graças a deus a gente já conseguiu uma pessoa da EMLUR para limpar, mas antes quem limpava era o professor de educação física, na outra escola é ainda assim que acontece.”
Por fim, apesar de todas as dificuldades, afirma o compromisso com a profissão:
“Tem duas bolas velhas e rasgadas, quando a gente quer dar uma aula legal a gente tem que trazer bola de casa.”
“A gente tem que falar nas dificuldades e tem que enfrentar.”

Lauro Pires Xavier Neto

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